Os locadores podem pedir a substituição ou reforço da garantia dos contratos de locação em que o garantidor possua um único imóvel (bem de família), sob pena de rescisão contratual. Devido à polêmica e atualidade deste tema, ofereço uma interpretação sobre o assunto neste artigo.
Buscando simplificar um tema bastante relevante e atual, vamos nos ater a discutir a essência da questão sobre a impenhorabilidade do bem de família frente a débitos decorrentes de um contrato de locação comercial, sem a citação de julgados ou referências legais. A ideia é dar uma visão mais global sobre o tema.
Nesse sentido, primeiramente, imagine-se buscando um local para instalar a sua empresa e, ao encontrar o imóvel ideal para aquilo que havia planejado, o locador venha a exigir – como de praxe – uma garantia para se concretizar tal locação. Daí, pesquisando o mercado, frente ao seguro-garantia e outras modalidades, você identifica como a melhor opção o oferecimento do seu imóvel de moradia como garantia, ou seja, se faria uma caução locatícia (entre outras modalidades de garantia real, que envolvem bens imóveis como garantia) baseada no seu bem de família (bem de família é o imóvel de uma entidade familiar, o qual, por disposição legal, não pode ser penhorado).
Por outro lado, agora se imagine na posição do locador. Este recebe o referido locatário, avalia todos os riscos do negócio, avaliando o cadastro deste último e as demais circunstância daquela locação naquele momento, o que envolve a segurança de receber uma garantia idônea que viabilize aquele risco do negócio. É essa visão da dinâmica entre riscos, frutos e respectiva garantia que essencialmente mobilizam a decisão de o locador aceitar aquele locatário e respectivo contrato.
Nesse contexto, é importante destacar que aquela proteção do bem de família (de que não possa responder por dívidas daquela família), por disposição legal apoiada por diversos julgados a respeito, não existiria mais para esse contrato de locação hipotético que estamos tratando, visto que tal proteção cai por terra se o imóvel for, de forma consciente, indicado como garantia pelos seus proprietários (pela respectiva família, então protegida). Em suma, a referida família estaria renunciando à proteção do seu bem de família frente a determinada relação jurídica, quando oferecesse esse bem em garantia daquela relação (aqui no caso para o contrato de locação da empresa).
No papel de locatário (empresário), fica evidente o impacto da perda da proteção do bem de família, uma vez que se colocaria em risco a moradia familiar. Se estaria autorizando a abandonar aquela família a própria sorte, permitindo “jogá-los na rua”.
Entretanto, como ficaria posição do locador, que pode não ter esse impacto tão grande, mas que pode contar com aquela locação para a sua subsistência? Quando o locador fez a mencionada análise de “riscos, frutos e respectiva garantia” da locação que estava para contratar com o locatário, este primeiro considerou a garantia sobre o imóvel (bem de família). Só contratou aquela locação, porque esta contava que tal garantia.
É sobre o enfrentamento dessas duas situações: (a) o direito de moradia e dignidade da pessoa humana do locatário; frente (b) ao direito de propriedade e segurança jurídica do locador.
Realmente, é um tema polêmico. Quanto aos contratos de locação residencial, se o bem a ser executado é o bem de família do fiador, já se tem uma posição mais consolidada no sentido de equiparar este ao locatário (veja que nesse caso o locatório não pode ter o seu bem de família penhorado por dívidas do próprio contrato de locação que firmou e, por isonomia, é conferida essa proteção também para o fiador, ou seja, o bem de família deste último não pode ser alcançado).
Já em relação aos contratos de locação não residencial, quando a garantia for oferecida por meio de fiança (fiador), o STF está apreciando julgamento decisivo a esse respeito e não há tal consolidação, pois até o momento, quatro ministros consideram que não há impedimento para a penhora, e outros quatro entendem que essa possibilidade viola o direito à moradia.
Por fim, quanto ao caso que trouxemos como exemplo, ou seja, em um contrato de locação não residencial com garantia real (caução locatícia), mesmo havendo a renuncia à proteção do bem de família, em fevereiro deste ano, o STF (REsp 1873203) determinou que o bem de família oferecido como caução em contrato de aluguel é impenhorável. Entretanto, a questão ainda será mais profundamente depurada, face à insegurança que esse posicionamento gera para o mercado, fragilizando importante garantia para os contratos de locação.
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