Assim como em outros tipos de sociedade, é fundamental ter um olhar preventivo sobre as questões jurídicas associadas à sociedade entre amigos. Saiba mais!
É comum que uma sociedade entre amigos gere entusiasmo e grandes expectativas, afinal, é um novo negócio que se inicia, sob o comando de pessoas que já se conhecem e confiam umas nas outras, trazendo uma percepção de oportunidade.
Porém, assim como em outros tipos de sociedade, convém manter uma postura preventiva quanto às questões jurídicas, a fim de evitar problemas futuros, que possam impactar negativamente no sucesso da empresa.
Pensando nisso, entrevistamos Daniel Cabrera, especialista em Direito Empresarial há mais de 20 anos, que compartilhou sua visão sobre os riscos jurídicos associados a uma sociedade entre amigos. Confira seu breve currículo:
- Daniel Cabrera é formado em Direito, com pós-graduação em Direito Civil e Processo Civil (EPD), Direito Tributário (Faculdade SBC) e Direito Digital (ITS-UERJ).
Possui MBA em Gestão Estratégica e Econômica de Negócios (FGV) e curso de atualização aprofundada em Direito Societário (FGV Direito SP).
É membro relator da Comissão da Sétima Turma do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB desde 20 de junho de 2022 e membro da Comissão Especial de Tecnologia e Inovação da OAB desde 4 de abril de 2022.
Foi presidente da Equipe BNI ABC Dinâmico, entre janeiro de 2015 e outubro de 2017, e vice-presidente na gestão de abril de 2022.
Boa leitura!
Sociedade entre amigos: é possível ser bem-sucedida?
Daniel Cabrera acredita que uma sociedade entre amigos tem as mesmas chances de sucesso que outros tipos de sociedade, porém, assim como outras empresas, exige um cuidado especial.
Ele ressalta que, em geral, esse tipo de sociedade se dá com a soma de esforços e investimentos entre amigos que têm outros negócios como principais. E, quando essa sociedade entre amigos tem essa característica de segundo negócio, é possível que ela seja negligenciada.
“As exigências que o negócio principal impõe para os sócios pode fazer com que eles não tenham o tempo necessário para cuidar da sociedade entre amigos. Portanto, isso é um risco bastante considerável, por ser o segundo negócio de todos”, pontua.
Cabrera destaca que também é muito comum que essa sociedade seja o negócio principal de apenas um dos amigos, o único que terá o cuidado de conduzir a empresa e que, nesses casos, pode fazer seus interesses prevalecerem.
“Quando esse sócio tem boa fé, quer conduzir a empresa para a saúde financeira, para buscar resultados, funciona bem. Acontece que se esse negócio começar a não ir muito bem, esse único que está conduzindo pode optar por se proteger”, alerta.
Justamente por isso, ele destaca que os demais sócios precisam dedicar uma atenção especial ao negócio.
“É nesse ponto que é muito importante ter um acompanhamento jurídico de cobrança dos demonstrativos, de reuniões periódicas formalizadas em atas. Dessa maneira, é conveniente fazer um documento base de constituição dessa sociedade, com regras bem claras, para que essa condução no dia a dia também não seja problemática.”
Ele acrescenta que também é essencial que todos os membros da sociedade acompanhem o negócio e estejam cientes de cada tomada de decisão. “Assim, eles poderão influenciar positivamente o sucesso da sociedade entre amigos”.
Medidas básicas para se iniciar uma sociedade entre amigos
Daniel Cabrera afirma que as medidas jurídicas fundamentais para se começar uma sociedade entre amigos incluem um bom documento de constituição, devidamente registrado, e uma contabilidade conservadora, para que possam ser emitidos documentos básicos como balanço, permitindo que todos acompanhem os demonstrativos e a destinação de valores.
“Também é importante efetuar reuniões de cotistas periódicas, com pauta prévia, que podem ser on-line. Depois, uma ata formal para que em um eventual desalinho do negócio, possa servir de fundamento para uma cobrança judicial. Os contratos que essa sociedade queira fazer com terceiros também precisam estar devidamente revistos e assinados”, aconselha.
Ele afirma que respeitar os mínimos pilares de governança é essencial para qualquer tipo de negócio. “E quando você não acompanha diretamente o dia a dia de um negócio, a governança ganha mais importância ainda porque é a forma de você, à distância, visualizar a condução do negócio, poder cobrar, questionar como está a situação etc.”
Como fica a sociedade entre amigos diante de um eventual divórcio ou falecimento de uma das partes?
Segundo Daniel Cabrera, esse é o dilema de qualquer sociedade. Ele ressalta que, muitas vezes, é utilizado um modelo de contrato social mais simples, que deixa essa regra em aberto, sendo que, nesses casos, é necessária a aprovação dos cotistas para a entrada de terceiros na sociedade.
Porém, ele enfatiza que pode haver algum dissenso acerca desse tema, o que é bastante prejudicial para a sociedade. Além disso, o pagamento das cotas que um herdeiro tenha direito pode ser muito impactante para o caixa da empresa, já que, caso não tenha estipulação específica no contrato social, na sociedade limitada o pagamento deve ser efetuado em dinheiro em 90 dias do falecimento do sócio, após o balanço especial para apuração do valor a ser pago aos herdeiros deste último.
“Então, imagine uma situação em que estes herdeiros tenham direito a 10% de uma sociedade limitada que vale R$ 10 milhões. A empresa teria que ter R$ 1 milhão no caixa para pagar para eles. Se não tiver esse valor, começa a haver uma pressão para o herdeiro ser aprovado como sócio ou de a sociedade ser demandada judicialmente”.
Para amenizar o impacto no caixa da empresa, ele aconselha que, nesses casos, o contrato social seja revisto para ser complementado com regras para esse tipo de situação. “Pode constar no contrato que, nesses casos, a empresa vai pagar em 180 dias a partir do balanço especial, a primeira de 180 parcelas, por exemplo, como uma proteção ao caixa da empresa, para a sua saúde financeira”.
Qual a estrutura jurídica mais adequada para uma sociedade entre amigos?
Conforme explicação de Daniel Cabrera, a dúvida central dos empresários que desejam constituir uma sociedade entre amigos é qual é a estrutura jurídica mais adequada.
Ele ressalta que o tipo de sociedade ideal depende muito do negócio, e que, depois de identificar a estrutura jurídica mais adequada para aquela situação, é essencial desenvolver um contrato alinhado com as expectativas de cada um dos sócios.
“Também é o momento de criar as regras de prestação de contas, determinar quem será o administrador e quais são suas obrigações diante dos demais sócios. Isso tudo ajuda muito no sucesso, porque você está constituindo regras com pilares de governança, e as regras estando claras, fica mais fácil tanto conduzir quanto identificar e reverter problemas”, diz.
Daniel relata que há muitos casos de pessoas que buscam apoio jurídico apenas quando já fizeram a constituição da empresa ou, às vezes, quando estão diante de algum problema.
“Muitas pessoas encaram o advogado como um solucionador de problemas. Mas essa não é uma visão que está em sintonia com as exigências do mercado atualmente. Hoje, uma pequena empresa deve ter um nível de compliance similar ao de uma multinacional, porque ela pode sofrer um passivo e ter que fechar as portas por causa disso.”
Ele frisa a importância de os empresários lidarem com a advocacia com uma postura preventiva. “É importante ter um apoio contínuo, como parceiros, “ombro a ombro”, trazendo essa cultura de compliance, de governança, essa cultura de preocupação com as questões jurídicas como algo hoje até impeditivo de alguns negócios”, finaliza.
Conclusão
Neste artigo, abordamos o tema sociedade entre amigos, a partir de uma entrevista com o advogado empresarial Daniel Cabrera.
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